Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.
Nelson Magalhães Filho
"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)
Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho
hoje é dia de tomar absintoJean-Nicholas Arthur Rimbaud nasce em 20 de outubro de 1854 em Charleville, nas Ardenas, no norte da França, perto da fronteira belga.
ADORMECIDO NO VALE É um vão de verdura onde um riacho cantaA espalhar pelas ervas farrapos de prata Como se delirasse, e o sol da montanha Num espumar de raios seu clarão desata.Jovem soldado, boca aberta, a testa nua,Banhando a nuca em frescas águas azuis, Dorme estendido e ali sobre a relva flutua, Frágil, no leito verde onde chove luz.Com os pés entre os lírios, sorri mansamenteComo sorri no sono um menino doente. Embala-o, natureza, aquece-o, ele tem frio.E já não sente o odor das flores, o macio Da relva. Adormecido, a mão sobre o peito, Tem dois furos vermelhos do lado direito. (Tradução: Ferreira Gullar)
6 comentários:
nelsinho,
merecida homenagem ao gênio diabólico.
buenas!
Também lhe fizemos homenagem n'O Bar e ao Bela Lugosi, no mesmo dia nascido.
Abraço!
Buenas, o que sempre digo de um gênio como ele é o seguinte:diante dos escritos de Rimbaud sinto-me um merda, insignificante, abraço.
Não é caso para isso, amigo Luciano... Rimbaud foi um génio absoluto, um deus pagão da poesia descido à terra. Não tem rival, como tal não nos diminui, competir com os deuses será sempre inglório... ;)
Abraço!
Rimbaud é bom pro rim.
Buenas, amigos do Ossian,fiquei um pouco consolado e aceitei o argumento, grande abraço.
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