foto de Ellen von Unwerth
O amor não é assim tão simples. Falávamos de bisturis e de como você consegue arrancar tudo aqui de dentro, me deixando assim, oca. Só porque perguntei como alguém oco pode amar... essa pergunta idiota. Amando, porra. Até bonecas infláveis amam e, melhor, não reclamam de nada, nem do movimento da música, do ritmo descompassado e dos pisões nos pés. Essas coisas das quais eu me enchia pra descarregar em você. Meu vazio me deixava mais segura, e ainda deixa.Acho melhor que você ame as infláveis. Antes elas dos que as instáveis. Palavrão que você adora, esse. Não entende nada de mulheres. Nem elas mesmas e vão todas às putas que as pariu. E te pariu. Arrebentou minha sandália, me deu torcicolo e ainda acha ruim quando eu reclamo da sua falta de aptidão pra dança. Te pago as aulas, desde que você leve a boneca. Nada de cintura quente roçando nas mãos, a professora é viúva e nada alegre. Estou na tua cola, não pise em falso, não pise em meus pés, aliás, recomendo que, comigo, você pise em ovos. Não, não nas nuvens. Quem falava em blues? Eu falo da vida, falo do amor e dessas coisas que você desconhece. Música não é tudo, e o amor não tem nada de fácil. O amor é só descompasso. O amor enlouquece marca passo, o médico não recomenda. Peça ao doutor pra te emprestar um bisturi mais moderno, aí, quem sabe, você, ao invés de arrancar tudo e deixar o oco, arranca o oco e me deixa tudo. Me deixe tudo e leve a boneca, os pés, bisturis, mate as aulas de dança e jogue fora as sandálias. Não esqueça o torcicolo. É teu, te concedo, amor.
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Samantha Abreu
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Samantha Abreu
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4 comentários:
Valeu, Nelson! Se eu não achar, te falo.
Abraços,
Renata
Buenas,texto difuder,lembrou-me o livro: "o amor é uma coisa feia".
Puxa, Nelson!
Obrigadíssima!
Um beijO!
Concordo com luciano, lembrou o livro de Gustavo Rios.
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