Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

segunda-feira, julho 28, 2008

Nelson Magalhães Filho. ANJOS SOBRE O RECÔNCAVO 2008. Acrílica s/tela, 80X70 cm
pernicioso aquilo me fez perceber
cruzes pintadas de cal
o sangue no chão
carcomido pelo teu segredo atormentado
de tanto comer centopéias
de tanto arroubo por avelãs.
Nelson Magalhães Filho

5 comentários:

marcio mc disse...

Encontrei fotos de algumas de suas telas e desejo publica-las no blog Imagens e conflitos.Com sua devida permissão é claro.Sou colega de Luciano Fraga.

Anônimo disse...

Valeu Márcio, pode usar as imagens. Grande abraço.

Kátia disse...

Gosto de suas tintas.Tanto nas telas,quanto nas palavras.São fortes,são rubras,são marcantes,são...intensas.E isso aproxima-nos.

Samantha Abreu disse...

belo!
me fez pensar em como ando mastigando formigas...

beijos, Nelson!

Álvaro Andrade disse...

os arroubos são sempre perigosos
quem vive disso
morre disso