PELA PRIMAVERA
Primavera de l985. Começo a escrever.
Faz de conta que sou poeta
"repelindo o absurdo cotidiano":
Eu sou a flor que sangra sobre as pedras
banhadas pelas águas
e pelas raízes da terra. Às 23h deitei-me estuprado
pelas luzes da rua que entravam pela janela do quarto.
Meus pés ficavam aquecidos pelo hálito
das lembranças.
Bia me dá tesão:
vou cobrir seus cabelos de rosas brancas.
(Pai foi trabalhar e mãe disse que
ano-que-vem teríamos um relógio novo
em cima do armário de vidro).
Mês passado fiquei deprimido. Era triste
ver Bia parada no meio do jardim
olhando os pardais nos oitis. O pior
daquela noite foi o vômito.
Sentia-me um Cortàzar expulsando coelhinhos da barriga.
Paródia da experiência!
Menstruação de Bia. Seu corpo era branco
passeando debaixo das árvores que racham passeios.
As casas com suas moscas. As aparências
o trânsito da terra...
Bia desapareceu domingo pela tarde.
Às 9h no telefone recitando-me
Whitman: "... um minuto e uma gota de mim
tranquilizam meu cérebro..."
Gostávamos de revelar segredos dos outros ou
as chuvaradas de setembro ou que Bia adorava
jogar verde ou o vento arrastando seus cabelos
junto com as folhas e as noites mal dormidas.
Pela manhã fiz a barba. Quantos dias
faltam para o carnaval?
A tarde salpicou meu tédio, amante Bia
suave Bia, te amo.
Nelson Magalhães filho
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Há 5 dias
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