Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

quarta-feira, setembro 20, 2006

ígneos devaneios
quando de vespa meus olhos
cuspirem teus segredos,
brisas agônicas
mesmo que no pernoite das aves
possam expelir tuas juras,
(quando você não mais me amar)
profetizam a aterrizagem das perdas
sem que haja tais véus a encobrir,
quando meus olhos os teus roerem.

Nelson Magalhães Filho

2 comentários:

Anônimo disse...

Bons e velhos amigos

Como faço rotineiramente, acessei o blog http://anjobaldio.blogspot.com/ e lá, alem dos belos poemas encontrei a dica de um show na Casa da Cultura:NUMAS,Geysa Coelho.Ele afirmava que certamente quem fosse assistir sairia presenteado e arremessado pela poesia áspera que seria tocada e cantada. Quem não foi, dançou ou melhor, não dançou, perdeu simplesmente. Conferi e pessoalmente fui arrastado por uma grande enxurrada , uma avalanche. Em poucos instantes já nem sentia os “meus pés no chão,dentro daquele Velho Navio, baby”.Fui capaz de visualizar Waly Salomão com os braços abertos gritando:”Experimentar o Experimental” e a “Memória é uma ilha de edição...” foi marcante, encantador.
E segue assim nossas vidinhas, construídas por um conjunto infinito de fatos quevão formando memórias e atiçando lembranças. Nascem assim através dos amigos, amores estranhos passageiros,viagens, paisagens, livros,filmes,discos, casas,ruas, mares, pequenas minúcias. Não quero me prender às lembranças tristes. Pessoalmente tenho algumas relações com meus discos, especialmente os antigos elepés (vinil). Sei que muita gente também tem.Quem não curtiu um velho bolachão (era um ritual), com aquele chiado, um pequeno arranhão aqui outro ali,como a própria vida, a agulha saltando PLOC ,PLOC, mas a emoção ainda assim rolava por conta da captação daquela coisa crua dos dedos escorrendo pelas cordas dos violões e guitarras que choravam, independente das capas e contracapas com fotos, desenhos,pinturas, as letras e seus autores, pura arte:Dylan, Zepplin, P.Floyd,Milton, Mutantes, Novos Baianos, Beatles, Lenon, Belchior, Fagner, Caetano, (TRANSA) que adoro,dentre milhares de outros.Desta maneira, momentos especiais(tristes,alegres,bêbados,fúnebres)ficaram encravados em nossas consciências para sempre e sem nenhuma alusão ao apego,não há preço que pague estas relíquias.Nestes “tempos modernos”,perdeu-se a magia.
Voltando às coisas que nos marcam, lembro daqueles que cultuavam suas lambretas, motocicletas, carros e até bicicletas.
Tenho um amigo(Almeidinha), que na época que estudava Agronomia(não nos tempos do “colega Nestor”), possuía uma Monark verde, velhíssima, com o quadro empenado (andava que nem cachorro vira lata, meio de lado , de banda) e ela era batizada como “A máquina do tempo” com carinho.Tive alguns carros marcantes.Um chevette amarelão era o “gema de ovos”, com descarga kadron,que berrava que nem boi e doía nos ouvidos. Um outro era a belina vermelha-“sangue de boi”, alguns amigos gostavam de chamá-la “la barca”.Ela participou de bons momentos de minha vida e de alguns amigos apesar dos apagões repentinos e inesperados que nos deixavam às escuras nas horas mais perigosas, depois acendia os faróis por conta própria. Fora o cheiro de gasolina que exalava e impregnava nossas roupas,cabelos e todo o corpo.Nunca descobrimos tais defeitos.
Recentemente o amigo Nelson Magalhães (Buenas), resolveu com sua extrema gentileza aliviar um pouco o meu sufoco, enquanto Juvenal(fusca fazendo plástica na oficina)não sai, emprestando-me o seu querido chevette Hatch presente do saudoso pai(“aquele menino mandou lembranças”).O dito era apelidado como “viado branco” (com certeza deveria ficar puto ,mas não podia falar nada, lógico).
Nada, absolutamente nada contra bichas, nem contra os brancos ou pretos ou amarelos ou sei lá qual matiz discriminatório e politicamente correto que arranjam por ai para identificar os humanos.O certo é que o coitado não era viado.Foi apenas uma coincidência com a placa 0024,.Também nada contra os números,bicheiros e apostadores de plantão deste milhar.O numero da placa foi mudado para alívio do velhinho.
No dia em que Buenas entregou-me as chaves,observei uma certa tristeza e má vontade por parte do carrinho.Afinal ele já estava acostumado com o rítmo do seu “dono” e então bancou algumas dificuldades,como menino mimado ou velho birrento.
A porta emperrou, manhas para abrir a tampa da mala, até a ignição precisa apertar a chave com um certo jeito senão o danado não funciona,não pega de jeito nenhum.Pensei:Calma amigo,vou te tratar bem,afinal estou ficando velho também e não sou daqueles que consideram os velhos chatos e decadentes.
O Hatch, viveu inúmeras aventuras.Quantos poemas, telas, textos, idéias, não nasceram dentro dele quando o artista descia aquele ladeirão, arrodeado por abismos no Campo Limpo, com apenas um farol aceso, todas no juízo e o motorzão do bicho roncando bonito VRUM,VRUM,VRUM também muito doido e feliz?.Participei de bons momentos levados por ele.Foi nele que trouxe numa certa madrugada um presente marcante dado pelo poeta Luciano Passos.SAGARANA.”John ,eu não esqueço”.Eu nunca esquecerei.
Ultimamente foi personagem de filme.Quem assistiu Alice pode ver o desempenho dele fugindo dos aleijões e sobreviventes da suposta radioatividade.Ganhou até um cabo para tocar MP3 e ele delira junto com o “dono”quando ouve o novo Dylan-Modern Times , que alguém ousou questionar: Quem precisa de Dylan? Amigos, além de nós até o chevettinho precisa , para sentir-se mais leve e romper esta vida cheia de buracos nas estradas repletas de curvas perigosas e inimigos sem precisar soluçar com seu carburador que já anda cansado e corroído pelo tempo.
Após o show, deixei Buenas em casa, deslizei pela madrugada de primavera nas ruas desertas de Cruz, bem devagarzinho, com todo cuidado como se estivesse passando sobre tapetes, sem viva alma a observar nós dois. Repartimos segredos,sorrimos,conver-
samos bastante e até choramos.Retornei para casa,guardei o velho Hatch que olhou para mim com os faróis baixos apagados, o coração ainda quente, pedindo que lhe desse um nome.Preferi deixar por conta do seu “pai”, mas disse para ele que de agora em diante o teria como um ENTE QUERIDO.
Assim caminha a humanidade. Violenta, desumana,mesquinha,presa a pequenas vaidades,desprezando as coisas mais simples, sustentada por um fiapo tênue e invisível que nos separa daqui.
Tem gente que nunca entenderá nada disso.Nem viverá.Mas,”quem viver chorará...” Acho que estou sendo “muito romântico”.Mas quem precisa disso?.



Autor Luciano Fraga

Anônimo disse...

Buenas,o texto abaixo nasceu por culpa exclusiva deste blog.Nem sei se cabe como comentário mas vai assim mesmo um abraço no aguardo de novos poemas. Bons e velhos amigos

Como faço rotineiramente, acessei o blog http://anjobaldio.blogspot.com/ e lá, alem dos belos poemas encontrei a dica de um show na Casa da Cultura:NUMAS,Geysa Coelho.Ele afirmava que certamente quem fosse assistir sairia presenteado e arremessado pela poesia áspera que seria tocada e cantada. Quem não foi, dançou ou melhor, não dançou, perdeu simplesmente. Conferi e pessoalmente fui arrastado por uma grande enxurrada , uma avalanche. Em poucos instantes já nem sentia os “meus pés no chão,dentro daquele Velho Navio, baby”.Fui capaz de visualizar Waly Salomão com os braços abertos gritando:”Experimentar o Experimental” e a “Memória é uma ilha de edição...” foi marcante, encantador.
E segue assim nossas vidinhas, construídas por um conjunto infinito de fatos quevão formando memórias e atiçando lembranças. Nascem assim através dos amigos, amores estranhos passageiros,viagens, paisagens, livros,filmes,discos, casas,ruas, mares, pequenas minúcias. Não quero me prender às lembranças tristes. Pessoalmente tenho algumas relações com meus discos, especialmente os antigos elepés (vinil). Sei que muita gente também tem.Quem não curtiu um velho bolachão (era um ritual), com aquele chiado, um pequeno arranhão aqui outro ali,como a própria vida, a agulha saltando PLOC ,PLOC, mas a emoção ainda assim rolava por conta da captação daquela coisa crua dos dedos escorrendo pelas cordas dos violões e guitarras que choravam, independente das capas e contracapas com fotos, desenhos,pinturas, as letras e seus autores, pura arte:Dylan, Zepplin, P.Floyd,Milton, Mutantes, Novos Baianos, Beatles, Lenon, Belchior, Fagner, Caetano, (TRANSA) que adoro,dentre milhares de outros.Desta maneira, momentos especiais(tristes,alegres,bêbados,fúnebres)ficaram encravados em nossas consciências para sempre e sem nenhuma alusão ao apego,não há preço que pague estas relíquias.Nestes “tempos modernos”,perdeu-se a magia.
Voltando às coisas que nos marcam, lembro daqueles que cultuavam suas lambretas, motocicletas, carros e até bicicletas.
Tenho um amigo(Almeidinha), que na época que estudava Agronomia(não nos tempos do “colega Nestor”), possuía uma Monark verde, velhíssima, com o quadro empenado (andava que nem cachorro vira lata, meio de lado , de banda) e ela era batizada como “A máquina do tempo” com carinho.Tive alguns carros marcantes.Um chevette amarelão era o “gema de ovos”, com descarga kadron,que berrava que nem boi e doía nos ouvidos. Um outro era a belina vermelha-“sangue de boi”, alguns amigos gostavam de chamá-la “la barca”.Ela participou de bons momentos de minha vida e de alguns amigos apesar dos apagões repentinos e inesperados que nos deixavam às escuras nas horas mais perigosas, depois acendia os faróis por conta própria. Fora o cheiro de gasolina que exalava e impregnava nossas roupas,cabelos e todo o corpo.Nunca descobrimos tais defeitos.
Recentemente o amigo Nelson Magalhães (Buenas), resolveu com sua extrema gentileza aliviar um pouco o meu sufoco, enquanto Juvenal(fusca fazendo plástica na oficina)não sai, emprestando-me o seu querido chevette Hatch presente do saudoso pai(“aquele menino mandou lembranças”).O dito era apelidado como “viado branco” (com certeza deveria ficar puto ,mas não podia falar nada, lógico).
Nada, absolutamente nada contra bichas, nem contra os brancos ou pretos ou amarelos ou sei lá qual matiz discriminatório e politicamente correto que arranjam por ai para identificar os humanos.O certo é que o coitado não era viado.Foi apenas uma coincidência com a placa 0024,.Também nada contra os números,bicheiros e apostadores de plantão deste milhar.O numero da placa foi mudado para alívio do velhinho.
No dia em que Buenas entregou-me as chaves,observei uma certa tristeza e má vontade por parte do carrinho.Afinal ele já estava acostumado com o rítmo do seu “dono” e então bancou algumas dificuldades,como menino mimado ou velho birrento.
A porta emperrou, manhas para abrir a tampa da mala, até a ignição precisa apertar a chave com um certo jeito senão o danado não funciona,não pega de jeito nenhum.Pensei:Calma amigo,vou te tratar bem,afinal estou ficando velho também e não sou daqueles que consideram os velhos chatos e decadentes.
O Hatch, viveu inúmeras aventuras.Quantos poemas, telas, textos, idéias, não nasceram dentro dele quando o artista descia aquele ladeirão, arrodeado por abismos no Campo Limpo, com apenas um farol aceso, todas no juízo e o motorzão do bicho roncando bonito VRUM,VRUM,VRUM também muito doido e feliz?.Participei de bons momentos levados por ele.Foi nele que trouxe numa certa madrugada um presente marcante dado pelo poeta Luciano Passos.SAGARANA.”John ,eu não esqueço”.Eu nunca esquecerei.
Ultimamente foi personagem de filme.Quem assistiu Alice pode ver o desempenho dele fugindo dos aleijões e sobreviventes da suposta radioatividade.Ganhou até um cabo para tocar MP3 e ele delira junto com o “dono”quando ouve o novo Dylan-Modern Times , que alguém ousou questionar: Quem precisa de Dylan? Amigos, além de nós até o chevettinho precisa , para sentir-se mais leve e romper esta vida cheia de buracos nas estradas repletas de curvas perigosas e inimigos sem precisar soluçar com seu carburador que já anda cansado e corroído pelo tempo.
Após o show, deixei Buenas em casa, deslizei pela madrugada de primavera nas ruas desertas de Cruz, bem devagarzinho, com todo cuidado como se estivesse passando sobre tapetes, sem viva alma a observar nós dois. Repartimos segredos,sorrimos,conver-
samos bastante e até choramos.Retornei para casa,guardei o velho Hatch que olhou para mim com os faróis baixos apagados, o coração ainda quente, pedindo que lhe desse um nome.Preferi deixar por conta do seu “pai”, mas disse para ele que de agora em diante o teria como um ENTE QUERIDO.
Assim caminha a humanidade. Violenta, desumana,mesquinha,presa a pequenas vaidades,desprezando as coisas mais simples, sustentada por um fiapo tênue e invisível que nos separa daqui.
Tem gente que nunca entenderá nada disso.Nem viverá.Mas,”quem viver chorará...” Acho que estou sendo “muito romântico”.Mas quem precisa disso?.



Autor Luciano Fraga