Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

sexta-feira, maio 25, 2007

Nelson Magalhães Filho. Série 2004-2006, mista s/ papel, 70X50 cm


pernicioso aquilo me fez perceber
cruzes pintadas de cal o sangue no chão
carcomido pelo teu segredo atormentado
de tanto comer centopéias de tanto arroubo por avelãs.

Nelson Magalhães Filho

3 comentários:

Anônimo disse...

sangue, cal, cruzes, carcomido: as palavras saltam dos sigificados e fincam-se nos significantes, criando um processo de transmutação das palavras, sendo elas simbolos dos simbolos transformados, aparecendo a poesia não pelo significado presente e aparente mas antes por toda uma composição atmosférica e sonora.uma poesia pintura.

Anônimo disse...

Sangue< cal, carcomido:
As palavras saltam dos significados e fincam-se nos significantes, criando um processo de transmutação das proprias palavras, sendo elas simbolo dos simbolos transformados, aparição da poesia não pelo significado presente e aparente, mas antes, por toda uma composição atmosférica e sonora.uma poesia pintura.

Linda Graal disse...

Nelson...gostei de muita coisa...mas esta pintura e este poema são os que mais me tocaram!!
parabéns!!

amplexos!

PS: obrigada pela visita! ;)