Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

sexta-feira, março 02, 2007


Priscila Fernandes é a poeta que vai se apresentar no Projeto Poesia na Boca da Noite, no próximo dia 06 de março (terça-feira), às 20 horas, no Restaurante Grande Sertão.
Priscila Fernandes nasceu em Salvador e tem 21 anos. Logo cedo descobriu, na estante de sua mãe, alguns livros de Cecília Meireles, e desde então se vê de mãos dadas com a poesia. Hoje, estudante de Letras na UFBA e de psicologia na FRB, Priscila mantém um blog onde publica seus poemas periodicamente: Chafariz.
PRIMAVERIL

Quisera ter guardado comigo
- segura -
a ultima flor da primavera passada.
E se ainda menos
fosse-me permitido,
a semente, talvez, bastaria.
Soube, por vozes frágeis,
que já não estarão as flores
na próxima estação colorida.
Antes houvesse roubado
uma única
[para que eu e o sol
continuássemos a ter motivo]

Priscila Fernandes

Um comentário:

Anônimo disse...

Nelson,beleza de poesia.Leve e profunda,grato.