Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

terça-feira, novembro 20, 2007

Diamanda Galás - I Put a Spell on You (live)





Nelson Magalhães Filho. ANGELS OVER CITY BLUES, 1998. Mista s/ lona, 130X110 cm

(Hoje de novo ouvindo Diamanda Galás)

Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.

Nelson Magalhães Filho

4 comentários:

Isa Lorena disse...

Novas visitas são sempre bem vindas. Pena que o Sanduba tá uma bagunça só...

Então lhe convido a uma nova visita em outro endereço - muito mais viável esteticamente:

www.poeticacotidiana.wordpress.com

bjo grande!

Anônimo disse...

Nelson,vou alterar a ordem das coisas:trilha,tela,texto para iniciar a semana,sempre pensando.

Braga e Poesia disse...

os porcos querem comer.
bala essa mulher cantando e o texto desnuda sua puntura e seu mundo numa tomada de posição que não é de agora, nelson essa sua busca é sem fim é buscar e buscar e buscar, por que esse é o mundo dos gritos dos porcos quando são assassinados.

sandro so disse...

arte e vida como sinônimos; ou até mais: acreditar na arte para mudar a vida, pobre, medíocre, mesquinha. arte e vida podem caminhar lado a lado, não a arte que idealiza a vida, mas a arte incorporada à vida. sempre gostei das idéias de o estilo do escritor ser comparável ao estilo da sua vida; e do estilo de vida do escritor ser escrever, viver para escrever, escrever para viver. acho que pintar também se casa com essa idéia. abração, nelson