Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

sexta-feira, agosto 31, 2007

Nelson Magalhães Filho. Série 2004-2006, mista s/ papel, 70X50 cm

você me adora-corrosiva
da dormência
mas nada disso adianta
lambendo os beiços ocultos.
eu desgasto
tudo ao mesmo tempo
incitando sua pureza crua
de demência
até luziada, mas
de uma outra forma,
mais arrojada de outra-aparência
as tripas
que sobram impetuosamente
nestas nossas vestes
sujas de asas
ouvindo bandoneón
adios nonino.

Nelson Magalhães Filho

4 comentários:

vieira calado disse...

Um poema de vastas sugestões, de que não entro referência de escola ou corrente literária.
Um abraço.

Vera Basile disse...

Oi Nelson!
Suas pinturas exalam o cheiro do óleo...é como se tivessem ainda frescas...o q me deu uma enorme vontade de voltar a pintar..rs
voltarei!!
bjs

Ruela disse...

Muito bom.
Um abraço!
;)

Anônimo disse...

Vieira Calado, Vera e Ruela: obrigado pela visita de vocês. Grande abraço.