O PIOR INIMIGO
Simulas tua queda dentro de mim, com seu orgasmo de tintas e livros gastos, escombros de vértebras e chaves cegas. Preparas um último verso em meu desmaio. Há muito não sonho com teus fantasmas azuis, e no entanto em palavras mesquinhas teu enxame de cadáveres se apropria da miséria de meus dias. Já não sei como lidar com a eloquência de teus espelhos. Até onde esgotar o sangue dissimulado com que regas teus campos. Descarrilhas em tuas pernas todo o ritmo de quimeras que rege a existência. Moscas regurgitam o útero aceso de tuas máquinas. Ciclos vorazes da soberba. Lábios metálicos consumindo frascos de metáforas anômalas. O mundo a teus pés, as pás do silêncio, o pó das surpresas. Há muito não há mais cura ou motivo para estar aqui. Teimamos porque a noite não se vai, porque persiste um labirinto profundo e delicioso ou simplesmente porque não sabemos como apagar esta lâmpada aflita do desespero. O mundo não obedece a mais ordem alguma e quando um de nós toca seu fundo já não há mais princípio ou fim, nada que reconheça o mito da ressurreição. Tuas lágrimas são fulgores vãos. A indignação uma paisagem transtornada e exposta a um reflexo risível de sua comiseração. Antes que fôssemos estas ruínas azuis eu tanto sonhei contigo ao ponto de me confundir com tuas sobras. Caminhamos pelas cidades, rimos de tudo, nos sentimos alheios à indigência humana. Nada é conosco e até nos orgulhamos de nossa descendência suicida. Por que ainda insistes nisto? Eu nunca estive aqui.
poema & imagem: floriano martins
agosto de 2007
Um comentário:
me atropelou...
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