Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.
Nelson Magalhães Filho
"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)
Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho
Nelson Magalhães Filho. Série LUARES SINISTROS, 2006, mista s/ papel craft, 120X105 cm quando me saquei te parindo mula dragãoporca, hein, eu te amo como os partosprematuros dos insetos multiplicando-secompulsoriamente cadavez mais e mais em suicídiosherméticos tocando-nos tanto de leve o rostoe não sentindo tuas mãos lindaseu dormente até às vísceras.cor de revelação dos santos.ou como beber vinhos coalhados-insensatezte amo vestida girassole duas chaves de marinheiropenduradas no pescoço delicado e dois enígmaslidos nas cartas desta madrugadadama dos visionários recortada de um livrode fumaça escoada, esverdeando-se.abarcas,tu: cavas minha menteem retalhose os segredos deixei-os nas gavetas vaziasquerendo-se descobrir àquela fundura.Nelson Magalhães Filho, de A Cara do Fogo
8 comentários:
esse poema é lindo.
É um estilo que gosto muito: me deixa sem fôlego e sem tempo de me defender.
quando percebo, já caí em fantasias...
"tu: cavas minha mente
em retalhos"
beijos.
Valeu Samantha. Obrigado por tuas palavras.
eu é que te agradeço. muito obrigado, valeu !!!!
"e os segredos deixei-os nas gavetas vazias/querendo-se descobrir àquela fundura."
lindo. tem lugar melhor para os segredos? desconheço.
Ediney e Katherine, voltem sempre.
Querendo-se descobrir àquela fundura...teu texto me pareceu assim tbm, inconseqüente. Mas eu fiz uma leitura superficial pq me encantei, e tive que driblar o fato que tô de saída. Eu volto p/um comentário mais honesto e decente(:
Muito bonito e forte o poema!
Amores assim fazem a vida valer a pena.
beijos e obrigada por suas gentis visitas,
MM.
...tão nu...
...tão visceral...
Postar um comentário