Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

terça-feira, outubro 23, 2007


um sol escabroso fez lanho em minha cara
sempre cometemos desagravos - desnebriamento
após o jorro assaz no fundo do beco
eu poderia ser serviciado de flores
mas apenas açulei teu animal contra a presa
uma fome que não se farta, quase noutada
caso dissecasse a dor flertaria com as estrelas
que me lambem, a tua carne pálida
o teu sangue violento nas veias maceradas pelo desconçolo,
eu poderia te beijar com melindre mas a língua azougada
teus ouvidos volúveis seriam azucrinados pela música
da lua ofuscada pelas náuseas enquanto você corcoveava
no fundo do beco
guarnecida de asas sob a lua saturada
continuo vomitando esse laivo de tristeza
noite já amadurecida por tua língua deslumbrava
uma nódoa de amor que não se farta
e o tempo vai embrutecendo com desforço nosso gozo
crivo de beijos anauseados até me soverter
com a volta do sol com seus golpes de facas.
Nelson Magalhães Filho

autoretrato digital

5 comentários:

Ruela disse...

visceral...muito bom.
abraço.

Anônimo disse...

Olá Buenas, lindo poema! uma cara esfaqueada pelo sol é demaisssssssss
bjs Lita Pássaro

Samantha Abreu disse...

putz!
senti um soco aqui no estômago.

Lindo!

beijos!

Fabrício Brandão disse...

Até quando amar será esse combate?

Abraços, meu caro!

Ana disse...

ihhhh
vc também é da Bahia... eu sou de Salvador... espero que possamos trocar conhecimentos...
também tenho um blog...
e gostei muito do seu...
bj...