Teu cheiro amarfanho durante toda a cidade
e nos dentes postos sobre a mesa
como um escapulário tua lascívia eu pressinto.
Nem a lua nem teus olhos certamente me salvarão deste teu cheiro espesso.
Eu cresci nestas estranhas paragens sem estrelas entre bichos e flores
como se não fossem cobertos pela escuridão.
Apenas arfava um golpe entre o vazio de mim
e a captura de insetos do inferno em teus cabelos.
Em inquietude, me preparo para a dor.

Nelson Magalhães Filho


"Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos

do mundo."
( Fernando Pessoa: Tabacaria)




Realizar trabalhos de arte a base das experiências existenciais, como transpor as imensidões dolorosas das noites urinadas. Fingir figuras concebidas do desejo e da amargura. Instigações obscurecidas pela lua. Não acretido na pintura agradável. Há algum tempo meu trabalho é como um lugar em que não se pode viver. Uma pintura inóspita e ao mesmo tempo infectada de frinchas para deixar passar as forças e os ratos. Cada vez mais ermo, vou minando a mesma terra carregada de rastros e indícios ásperos dentro de mim, para que as imagens sejam vislumbradas não apenas como um invólucro remoto de tristezas, mas também como excrementos de nosso tempo. Voltar a ser criança ou para um hospital psiquiátrico, tanto faz se meu estômago dói. Ainda não matem os porcos. A pintura precisa estar escarpada no ponto mais afastado desse curral sinistro.
Nelson Magalhães Filho

terça-feira, janeiro 23, 2007

Nelson Magalhães Filho. Série 2004-2006, mista s/ papel, 70X50 cm

desaquieto de martírio-precede a morte
visado pelo cheiro embebido-fanatismo
sensual intenso: inseto noturno
a depravar uma fragância que verte
pelos lábios túmidos, sente dentro de si
muito ardente fundo-anseio de fim
sem vir a ser
apenas principiar efêmeros desejos.

Nelson Magalhães Filho

Um comentário:

Anônimo disse...

um vir-a-ser sem vim a ser .poema de cores ardentes e principiador de letergicos desejos em efemeros estados de vida, poema cor e paixão,desenfreando acordos entre o nada das sombrias caladas amantes versus os sorrisos das esposas esperantes.meiguice em doses crueis e antes o retorno do viver abertamente.
e quanto a pintura acima traduz textos de lembrancas estoicas em avôs e avòs e quintais e cerejas.